Liderança Carismática, Transformacional e Transacional
Neste artigo o autor tem por objetivo fazer uma revisão teórica sobre a liderança carismática, transformacional e transacional provocando reflexões sobre os contextos do mundo B.A.N.I e a sociedade do cansaço.
Neste artigo temos por objetivo revisitar a teoria que sustenta a liderança carismática, transformacional e transacional e gerar no leitor reflexões sobre a eficácia dessas abordagens para a transformação de empresas em um mundo de constantes mudanças.
Atualmente as organizações trabalham para atender as expectativas de um mercado consumidor cada vez mais exigente. Além da venda de produtos e serviços, espera-se que as empresas tenham responsabilidades além do lucro. Tais responsabilidades estão presentes nos pilares ambiental, social e de governança (ESG – Environmental, Social and Governance, em inglês e Ambiental, Social e Corporativa, em português). Este assunto é de interesse da alta administração, uma vez que firmam-se possibilidades de aumento de competitividade enquanto avançam em condições socioeconômicas das comunidades em que a empresa opera (Porter & Kramer, 2011).
Segundo Antonakis & Day, 2018, há uma complexidade científica em definir liderança, mas que para eles uma possível adoção é:
Liderança é um processo formal ou informal, enraizado contextualmente e influenciado por metas, que ocorre entre um líder e um seguidor, grupos de seguidores ou instituições.
A ciência da liderança é o estudo sistemático desse processo e de seus resultados, das relações com as características e comportamentos do líder, das inferências feitas pelos observadores sobre as características do líder e das atribuições feitas pelos observadores em relação aos resultados da entidade liderada.
Além do ESG, há o contexto do mundo “B.A.N.I” (Cascio, 2018), o termo é uma sigla em inglês que significa Brittle (frágil), Anxious (ansioso), Non-linear (não linear) e Incomprehensible (incompreensível), cujo foco vai além da mera produção e eficiência industrial, priorizando a qualidade de vida dos funcionários e seu bem-estar emocional. É um novo paradigma que reconhece que as organizações precisam não apenas de recursos humanos, mas também de recursos emocionais e psicológicos para prosperar, e consequentemente de uma liderança que atenda a essa demanda.
Segundo Liden & Antonakis, 2009, reconhecer que a liderança está enraizada em um contexto, o qual pode afetar o tipo de liderança que emerge e se será eficaz ou não, torna a discussão sobre a Liderança mais do que atual.
ATUALIDADE
Vivemos em uma sociedade do esgotamento (Byung-Chul Han, 2015) que critica os conceitos de positividade e produtividade que o mundo do trabalho e a sociedade nos exige hoje, somados às características do conceito de mundo B.A.N.I, tornaram a ciência da liderança algo a ser explorado com pragmatismo e novas lentes.
Os modelos de liderança se deslocaram de modelos que focam nas tarefas ou relações para formas poderosas de liderança baseadas em símbolos, valores e emoções (Antonakis, 2018). A maioria desses modelos é derivada da liderança carismática. Esta por sua vez retoma a cena da pesquisa em liderança através das lentes de autores, como: House, Bass, Burns e Downton.
Bass (1985), derivando da carismática cunhou o conceito de liderança transformacional, pois acreditava que uma forma diferente de liderança era necessária para explicar o fenômeno: seguidores centrados em um senso de propósito versus uma missão idealizada. Esta abordagem crê que os comportamentos idealizados e inspiradores do líder transformador levam os seguidores a transcender seus interesses individuais em prol do bem maior.
REVISÃO DA LITERATURA
Liderança Carismática, transformacional e transacional
Para discutir como a abordagem da Liderança Carismática pode ser eficaz para empresas inseridas em contextos de rápidas mudanças, é importante estabelecer alguns conceitos.
O primeiro deles é sobre o Carisma, segundo Weber (1947) o termo “carismático” é utilizado para descrever um tipo de líder capaz de promover mudanças sociais, referindo-se a “dons específicos do corpo e espírito não acessíveis a todos” e podiam realizar grandes feitos. Segundo Nisbett & Walmsley, 2016, esta definição está em constante evolução nas pesquisas, desde a relação: o líder e o seguidor, o líder e muitos seguidores, o líder e as trocas sociais, os líderes e os seguidores constroem conjuntamente a imagem carismática do líder e o fascínio do seguidor pelo apelo do líder.
Sobre a Liderança Carismática de maneira mais objetiva é possível, de acordo com Antonakis et al, 2016, defini-la: como “sinalização de liderança baseada em valores, simbólica e carregada de emoção”. No entanto, tal definição não preenche todas as variáveis envolvidas nessa abordagem e por isso o autor complementa com três atributos/comportamentos do líder:
- justificando a missão apelando para valores que distinguem o certo do errado;
- comunicando de maneiras simbólicas para tornar a mensagem clara e vívida, também simbolizando e incorporando a unidade moral do coletivo em si; e
- demonstrando convicção e paixão pela missão por meio de manifestações emocionais.
É de suma importância destacar que House (1977) propôs pela primeira vez uma teoria psicológica da liderança carismática e desde então esta vem sendo amplamente estudada e ampliada.
Há indícios desses elementos carismáticos encontrados nos escritos de Aristóteles em seu livro “Retórica”, onde os fundamentos da retórica são elementos táticos imprescindíveis para induzir o efeito carismático. Estes, por sua vez, trazem a tríade ethos, pathos e logos, que respectivamente incluem fornecer uma perspectiva moral por meio de seu caráter pessoal , provocar emoções nos seguidores e então usar argumentos racionais.
Destes avanços, surgem as derivações das abordagens carismáticas, dentre elas a Liderança Transformacional e a Transacional. Segundo Burns (1978) as definições:
(a) liderança transacional, que envolvia uma relação baseada na troca de itens valorizados, seja política, econômica ou emocional, ou
(b) liderança transformadora, onde a motivação, moralidade e aspirações éticas tanto do líder quanto dos seguidores são elevadas.
A liderança transformadora é focada em metas e ideais transcendentes e de longo alcance, tendo um efeito maior sobre seguidores e coletivos. A liderança transacional é focada em papéis e requisitos de tarefas. No âmbito dos valores a liderança transacional, concentra-se em promover o auto interesse e, portanto, é limitada em escopo e impacto, a liderança transformadora elevam a consciência dos seguidores para o que é importante, especialmente em relação às implicações morais e éticas, fazendo com que transcendam seu autointeresse em prol do bem maior (Antonakis & Day, 2018).
Burns via estas abordagens como dois extremos opostos do mesmo espectro, ambas contribuindo para o propósito humano, de um lado os valores modais (transacional) e do outro os valores finais (transformacional). Os líderes transformadores têm valores muito fortes. Eles não diluem seus valores e ideais morais por meio de consenso; pelo contrário, eles elevam as pessoas usando o conflito para envolver os seguidores e ajudá-los a reavaliar seus próprios valores e necessidades.
CONCLUSÃO
A liderança transformacional, carismática e outras abordagens denominadas “neo-carismáticas” (Liderança Ética, Consciente, Assertiva etc) compõem o paradigma de liderança mais dominante e ocupam o primeiro lugar em termos de artigos publicados em todas as principais revistas (Antonakis, 2017, p 37-38).
Sem a pretensão de esgotar o tema, as abordagens de liderança tem a sua efetividade de acordo com o momento em que a empresa se encontra. Contudo, nos cenários de constantes mudanças, a liderança transformacional, torna-se a de maior efetividade por trabalhar símbolos, emoções e valores, cujo resultado é a consolidação de uma cultura organizacional forte que pode ser desenvolvida como um ativo intangível da organização para adaptar-se aos contextos de mudanças.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
Antonakis, J., & Day, D. V. (Eds.). (2017). The nature of leadership. Sage publications.
Antonakis, J., Bastardoz, N., Jacquart, P., & Shamir, B. (2016). Charisma: An ill-defined and ill-measured gift. Annual Review of Organizational Psychology and Organizational Behavior, 3, 293-319.
Bass, B. M., & Bass Bernard, M. (1985). Leadership and performance beyond expectations.
Cascio, J.; O que é mundo BANI e quais são os impactos na sua vida? Futurotopia, 2022. Disponível em: <https://futurotopia.com/2023/06/27/o-que-e-mundo-bani-e-quais-sao-os-impactos-na-sua-vida/>. Acesso em: 01 de dez. 2023.
Han, Byung-Chul. Sociedade do Cansaço; tradução de Enio Paulo Giachini. 2ª edição ampliada – Petrópolis, RJ: Vozes, 2017.
Liden, R. C., & Antonakis, J. (2009). Considering context in psychological leadership research. Human relations, 62(11), 1587-1605.
Porter, M. E.; Kramer, M. The Big Idea: Creating Shared Value. Harvard Business Review, Massachusetts, v. 89, n. 1-2, pp. 85-98, jan./fev. 2011.
Erlan Dias
Diretor e fundador da CGLC, Diretor no Centro das Indústrias do Estado de São Paulo e Mestrando em Gestão das Organizações Contemporâneas pela Fundação Dom Cabral